quinta-feira, 17 de março de 2011

As Lendas e Mitos que constituem a génesis de Barcarena

Origens e curiosidades que só muito mais tarde foram o sustentáculo da história da freguesia de Barcarena

   Barcarena contém muitas lendas e mitos, algumas que bem podem ser consideradas fidedignas por apresentarem alguma verosímilhança, outras nem tanto, mas a verdade é que todas elas são dignas de registo, porque actualmente, acabam por fazer parte da história desta freguesia.
   Ninguém poderia imaginar o valor que possuía a Ribeira de Nina, que atravessa o lugar de Valejas, que em séculos mais atrás tinha essa denominação mas que actualmente é conhecida pela ribeira do Jamor.
  Um singelo ribeiro, sem grande influência que vai desaguar à Cruz Quebrada ao rio Tejo e que, nestes últimos anos tem estado bastante poluído.
     Esse curso de água bem definido há uns séculos atrás, era uma das razoáveis fontes de riqueza do reino, pois dela eram retirados avultados fundos que tinham de ser pagos pelo povo, através dos cobradores da época que canalizavam aquelas verbas para o respectivo rei.
    A ribeira do Jamor que actualmente, pouco ou mesmo nenhum peixe contém devido à grande poluição, em tempos recuados era forte em pescado e quem nela pescava, tinha de pagar uma dízima que os cobradores de impostos, os conhecido magistrados do reino que davam pelo nome de “Ouvidores”, não perdoavam, pelo menos é o que consta em antigos documentos que fazem referência a essas cobranças.
   O rio Tejo estava bem mais acima do seu nível e como tal as águas entravam nas três ribeiras existentes na área do concelho e por isso mesmo o pescado refugiava-se nelas naturalmente.
  Os livros antigos dão conta também das grandes barcas que subiam a ribeira de Barcarena, durante a maré-cheia, pois vinham buscar os barris de pólvora para serem levados para as grandes naus que atravessavam os oceanos a caminho das possessões então conquistadas pelos portugueses.
   As barcas vinham vazias, “Ribeira a cima”, que acabaria por dar o nome a um lugar da freguesia e ficavam bem perto da fábrica.
   Eram carregadas e quando a maré voltava a subir, deslizavam “Ribeira a Baixo”, outra nomenclatura actual, com a maior das facilidades, até ao rio, onde em Caxias, foz da ribeira de “Berquerena”, as grandes naus as esperava na baía de Paço de Arcos, sendo depois descarregadas.
   Pólvoras que seguiam para diversos sítios que iam assegurar a manutenção desses territórios ultramarinos, contudo hoje, com o abaixamento do nível das águas, essas ribeiras não são navegáveis e as novas gerações quase não acreditam que isso tivesse sido possível, no entanto, sabe-se que o mar há muitos milhões de anos, tinha baixado grandemente, a ponto de ter subido depois cerca de cento e vinte metros e foi nesse período que as ribeiras eram navegáveis, como nos prova ainda hoje, o castro neolítico de Leceia, onde foram encontrados a alguns metros acima do actual nível das águas, conchas, cascas de mexilhão e inclusivamente um anzol, o que prova que, o mar chegava ali, e por essa ribeira entravam barcos que iam a “Lycea”, nome antigo dessa localidade, transaccionar produtos, como azeite, vinho e cereais em troca de cerâmicas e outras coisas de que necessitavam os moradores daquela zona.
    Também não é menos verdade a história que se conhece e se diz ser a origem da nomenclatura de Barcarena, em tempos mais recuados, conhecida por Berquerena.
   Dizia-se viver por ali perto, uma rapariga muito bonita, que, por ser filha de gente abastada, possuía uma linda barca, na qual passeava de quando em quando nas águas da ribeira.
    Essa rapariga, que consta tratar-se de uma princesa, chamava-se Rena e como a barca se encontrava por ali sempre ancorada, quando a bela menina não a utilizava, as pessoas que passavam pela margem do ribeiro, garantiam tratar-se da “barca de Rena” e assim ficou baptizado o lugar, como Barquerena que resistiu até aos nossos dias.
       Muitas foram as lendas e histórias que se criaram sobre esta freguesia e que acabam, não só por dar nome às localidades, como a génesis da freguesia que depois, em redor destes acontecimentos se criou um forte fluxo demográfico, atingindo hoje mais de vinte e cinco mil almas, distribuídas por cinco lugares distintos.
     Tercena, vem da palavra árabe Torgena que, no século XIII dava nome ao local que hoje conhecemos com a nomenclatura de Tercena.
     Segundo se constatou em estudos efectuados na Torre do Tombo, todo este espaço agrícola pertencia a um clã que era conhecido pela “herdade dos homens de Torgena”, (1260) famílias de agricultores que viviam do amanho das férteis terras, que mais tarde, confirmariam mesmo essa fecundidade, mas que depois se transformaram, por força da modernidade, em bairros urbanos.
     Já dizia o grande Marquês de Pombal, que as terras de Cabanas eram as mais férteis da Europa e por isso já na nossa contemporaneidade confirmamos isso mesmo, com as grandes searas de trigo que ali se produziam e que deram origem a uma invasão de pessoal oriundo de várias partes do país e que baptizaram as suas trabalhadoras, por “macanitas”.
   Torgena foi o nome dado a todo este espaço que depois se foi definindo e dividido por parcelas a ponto de termos conhecido diversos nomes, todos influenciados nessa primeira nomenclatura, como Tarcena, Tracena, mais tarde Tercenas (1865) e até à segunda década do século XX, Torcena, desconhecendo-se no entanto a data em que deixou de ter a última nomenclatura e passar a chamar-se Torcena e só nesta altura, se definiu o nome da terra passando a ser conhecida por Tercena, por finalmente, entenderem os mais letrados, que Tercena eram silos cerealíferos à beira rio, ou arsenais onde se guardavam explosivos, ideia que só é conhecida a partir do século XV com a implantação das rudimentares fábricas de pólvora conhecidas pelos “engenhos de fabrico de pólvora” criados à beira da ribeira e só em 1729, ter nascido a sério a Real Fábrica da Pólvora, hoje, felizmente extinta, pela mão de António Cremer, um reconhecido e competente técnico suiço.
    São todas estas histórias que dão nome ás localidades, que completam e sustentam o seu rico e credível historial de Barcarena, facto que foi sempre ignorado, ou antes, desinteressado pelas pessoas dessa época, mas que, a partir de um maior desenvolvimento literário e cultural, as novas gerações, mais instruídas, e sobretudo dotadas de uma nova mentalidade, onde a curiosidade se destacava, entenderem aprofundar estudos sobre o passado, baseados em escritos deixados e que hoje muito contribuem para o conhecimento e evolução dos nossas povos, dos nossos descendentes, e afinal das nossas verdadeiras e ancestrais raízes.

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