sábado, 26 de janeiro de 2013

À descoberta do Historial de Barcarena

SERÁ QUE VAMOS VOLTAR À LUTA E DITADURA
 DOS ANOS TRINTA DO SÉCULO PASSADO ?
   Barcarena sempre foi reconhecida como uma terra vanguardista, referência que já vem das primeiras décadas do século passado.
  A existência da Fábrica da Pólvora e os baixos ordenados que os seus operários auferiam, contribuíram bastante para que alguns funcionários se movimentassem em Barcarena no sentido de quererem dar melhor nível de vida à sua população.
   Também por outro lado existia um razoável número de pessoas que trabalhava na Casa da Moeda em Lisboa e noutros locais que igualmente conspiravam contra o Estado Novo, onde Salazar, depois de ter assumido a presidência do conselho passou a dispor de uma grande autoridade sobre o controlo do Estado o que desagradou bastante o povo português.
   Por um lado, quando Salazar assumiu a pasta de Ministro das Finanças em 1928, substituindo o barcarenense Sinel de Cordes, as pessoas pareciam gostar dele, na medida em que o país vinha a ser governado aos atropelos, com muita escaramuças, numa verdadeira anarquia, muito especialmente depois da I Guerra Mundial, onde os governos tombavam sucessivamente.
   Mas Barcarena apesar de ter todo esse movimento revolucionário tinha como filho da terra esse político, homem que acabaria mais tarde por ser também ministro de António Oliveira Salazar, igualmente mal sucedido, por quem quase todos que lutavam contra a ditadura do seu chefe, e líder detestavam no entanto, apesar dessa sua adversa posição, Sinel de Cordes terá retirado da prisão do Aljube dois comunistas barcarenenses, mas mesmo assim a aversão que havia jamais fora retirada, e mesmo depois de ser excluído do governo, por insistentes maus resultados na pasta das finanças, o povo barcarenense o considerou a ponto de ter sido retirado o nome que tinha na rua principal de Barcarena e trocado pelo esquerdista Felner Duarte, que, acabaria por gerar grande polémica na altura
     João Sinel de Cordes que viveu na Quinta do Jardim no Murganhal, era filho de Baltazar António Sinel de Cordes e de Maria Clementina Braamcamp Ludovice da Gama, foi Ministro das Finanças por três vezes após o movimento do 28 de Maio de 1926 durante a Ditadura Militar e durante a Ditadura Nacional, tendo negociado com a Sociedade das Nações, um empréstimo a Portugal, no valor de 12 milhões de libras esterlinas, para evitar a bancarrota, mas acabaria por deixar as Finanças Públicas da Ditadura Militar num estado deplorável, situação com que teve de se defrontar com o ministro que lhe sucedeu em 1928, precisamente, Salazar.
   Nessa altura o Estado Novo foi também rotulado de salazarismo, em referência a António de Oliveira Salazar, o seu fundador e líder tornando-se, nessa pasta, figura preponderante no governo da Ditadura Militar já em 1930, valeu-lhe o epíteto de "Ditador das Finanças", ascendendo a Presidente do Conselho de Ministros, ou seja primeiro-ministro, em Julho de 1932, posto que manteve até ao seu afastamento por doença em 1968.
   A designação “salazarismo” reflectia a circunstância do Estado Novo se ter centrado na figura do "Chefe" Salazar e ter sido muito marcado pelo seu estilo pessoal de governação.
   Quando Salazar tomou conta do Governo as pessoas pareciam gostar dele, na medida em que o país vinha a ser governado aos atropelos, com muita escaramuças, numa verdadeira anarquia, muito especialmente depois da I Guerra Mundial, onde os governos tombavam sucessivamente.
    Foi uma individualidade que brilhara nos seus estudos académicos e por isso tomado como uma figura importante em Coimbra onde estudara e se formara e como tal aconselhado para formar um Governo, no entanto na sua primeira chamada, ele propôs o que pretendia fazer e logo recebeu o não, pois fartos de ditadura estavam os portugueses, aquando prevalecia a monarquia no país.
   Salazar voltou à sua vida de docente, e pouco se importou em não formar governo, contudo o descalabro político continuava de tal ordem que outro remédio não houve senão chamar então definitivamente António de Oliveira Salazar e aceitar as suas condições.
   Nos primeiros tempos o povo sentiu-se feliz com o seu trabalho, pois as finanças melhoraram a vida dos portugueses terá sofrido boas e significativas alterações, mas a partir da década de trinta, o grande economista, apertou as suas doutrinas e tudo passou a ser mais complicado para a classe trabalhadora, pois começava a desenvolver-se uma política tendencial para as classes mais abastadas, ideia talvez errada do presidente, pois pensou ser por essa via, que o país mais progredia por ser esse abastado estrato social que mais poderia investir no nosso pais, e sem investimento nada poderia singrar, o que hoje paradoxalmente, os governos parecem não entender assim.
   O povo sentiu-se acorrentado, sem recursos e sem hipóteses de dar largas às suas apetências, e a notar que de facto em Portugal começava a haver dois grupos sociais, os ricos e os pobres, ideia que contrariava bastante as leis democráticas, o que Salazar desprezara sempre, pois era ele que mandava e nada mais crepitava na sua cabeça de ditador profundo.
  Foi então que em Barcarena, aliás como em outros locais do país, as pessoas começaram a insurgir-se contra estas contrariedades, que fugiam bastante daquilo que o povo vinha a ser acostumado e logo de início os prevaricadores começaram a receber grandes castigos, pois quem conspirasse contra o Estado Novo, era preso, torturado nas prisões, sendo famoso o presídio do Aljube, e depois o Tarrafal em Cabo Verde para os mais renitentes e agressivos, assim como Caxias recebia igualmente os que andavam fora das leis salazaristas.
    Em Barcarena os revoltados conspiravam constantemente contra as leis repressivas de Salazar que inibiam o seu povo, principalmente os estratos sociais mais baixos da população a viverem condicionados ao produto miserável do seu trabalho, os filhos a não poderem estudar porque era incomportável, pois só quem tinha esse direito eram os ricos, e então nada mais lhes restava que não fosse seguir a vida de seus progenitores, agarrados aos poucos serviços que apareciam nomeadamente na fábrica da pólvora ou no campo, dependendo fortemente dos seus biscates particulares e manutenção séria das hortas e capoeiras de animais que criavam com restos de comida, que eram a base de sua alimentação.
   O barcarenense Felner Duarte alistou-se às comunas que actuavam clandestinamente na capital e arredores pois preparavam constantemente intentonas para destronar o governo salazaristas, mas a actuação, nada de concreto alcançava, resultando quase sempre numa série de prisões porque a polícia astuta de Salazar actuava com eficácia e celeridade, não perdoava, aplicando castigos terríveis e por vezes sem grandes razões, pois prendia ao mais pequeno indício de prevaricação.
     Numa dessas muitas tentativas, três empregados da Fábrica da Pólvora, Felner Duarte, Júlio do Rego e Joaquim Silva entenderam colaborar e extorquiram da fábrica da pólvora de Barcarena uma grande quantidade de nitrato de potássio para com ele os entendidos na capital fabricarem bombas artesanais, colocando esse explosivo dentro das maçanetas que roubavam das portas de casa, que eram lançadas aqui e além, só que, acabaram por ser descobertos e se o principal titular foi desterrado para Timor onde viria a morrer atacado pelos japoneses que entretanto tinham atacado a ilha, o Júlio, desviara-se inteligentemente para África e o Joaquim da Silva conseguira escapar ao terror do presídio, devido à sagacidade de sua esposa que o escondeu dentro de um forno de cozer pão, fugindo assim aos sagazes homens da Pide.
   Mas Barcarena continuava a dar nas vistas, porque depois deste episódio que deixou o povo ainda mais revoltado, surgiram outros residentes a querer dar à sede de freguesia do concelho de Oeiras, dotações que muitas outras com maior dimensão não possuíam ainda.
   Foi criada uma farmácia, um jornal, um montepio que apoiava os trabalhadores de forma já muito compensadora, um grémio agrícola, uma cooperativa de consumo, já que antes a localidade tinha fundado uma associação de bombeiros, um posto médico, uma casa do “bailho”, onde o povo se divertia e todas estas estruturas sociais foram dando nas vistas a ponto de Salazar ordenar a seus homens para vigiarem e descortinarem porque razões tudo isto aparecia numa freguesia tão pequena que pouco mais de quinhentas pessoas teria nessa época.
    O resultado foi devastador, pois os cabecilhas de todas estas obras vanguardistas, acabaram por ser presos, uns porque eram empregados do Estado, caso de alguns funcionários da Casa da Moeda, outros da Fábrica da Pólvora e não tinham o direito de trabalhar para estas causas humanistas e como a revolta tinha sido grande contra o fascismo, atirou-os para as prisões cumprindo severos castigos, perdendo os seus bons empregos conseguidos anos antes de Salazar iniciar a governação e obviamente, que todas estas estruturas acabaram por se perder precocemente por falta dos verdadeiros cabecilhas e cartolas, à excepção dos bombeiros, da cooperativa de consumo e pouco mais.
  Foram todas estas estruturas que levaram a polícia do Estado a ter, a partir dessa época, uma maior atenção sobre aquela localidade, o que revoltava cada vez mais os que actuavam clandestinamente e de quando em quando lá ia mais uma série de homens presos por serem coniventes com alguns que já estavam encarcerados, muitos deles sem a mínima razão, o que obrigava a pesados castigos e a perderem os seus valores, deixando muitas casas à mingua, por lhes faltar o chefe de família, como acontecera com Serafim Nogueira, Heliodoro Pereira, mais tarde Pedro Barreiros e seu filho Serafim e tantos, só que essa preferência, essa luta clandestina, jamais deixaria de funcionar na freguesia de Barcarena, daí que os tempos mais recentes a localidade ainda tivesse sido governada por homens de esquerda, agora transformados em comunistas, principalmente depois da revolução de “25 de Abril”, mas como se verificaram melhorias, toda essa onda esquerdista se perdeu um pouco, entrando numa normalidade e num grande sossego político.
     Só agora, depois de ter entrado Passos Coelho para o governo, a revolta passar a invadir o cérebro dos portugueses, mas as tradições brandas do povo estão a obrigá-lo cobardemente a aceitar todas as suas nefastas decisões propostas por uma injusta Troika, deixando o povo à mingua.
    Na realidade a continuar assim, bem poderá haver um regresso a todas estas características que marcaram o povo português nas primeiros décadas do século passado, incluindo os barcarenenses, precisamente à quase cem anos, mas na verdade os tempos são outros, as mentalidades diferentes e fundamentalmente o emprego já é diverso, embora difícil de se conseguir, só que já não existe uma fábrica da pólvora em plena laboração, e o povo também adquiriu um estatuto bem mais apaziguador, que lhe permite tudo aceitar, discutir mas calar-se cobardemente, subjugando-se às ordens de um novo ditador que dá pelo nome de Pedro Passos Coelho e que para revolta maior dos habitantes desta freguesia, viver precisamente a pouco mais de um quilómetro da nossa gente, mais propriamente na vizinha povoação de Massamá.
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