O MARINHEIRO, O AMIGO, O PINTOR E O EX-AUTARCA DEIXOU-NOS PARA SEMPRE
Quem diria que o marinheiro, o amigo, o pintor e o ex-autarca completaria oitenta anos a 18 de Janeiro do próximo ano ?...
Com a vitalidade que exibia Augusto Lenine Abreu, ninguém podia acreditar que a sua morte acontecesse assim tão rapidamente, mas a grande verdade é que ela surgiu inesperadamente deixando a população de Barcarena numa grande consternação, pois era um homem demasiado conhecido, atencioso, muito preocupado com o problema dos outros, e sempre com uma história para contar, onde a marinha era obrigatoriamente o principal protagonista.
Falava-nos por vezes do seus importantes trabalhos, quase sempre desvalorizando as suas habilidades, mas a verdade é que as suas obras tinham muita qualidade, daí receber sempre muitos pedidos, o que ele francamente não podia corresponder.
A arte de pintar sobre azulejo, só ele sabia dar o tal toque final que fazia agradar o amigo. Os preços … ora os preços era o quanto bastasse para pagar os materiais porque de resto jamais seria com esta sua arte que Lenine iria enriquecer, pois ele pintava por gosto, por distracção e também para satisfazer a vontade dos seus amigos.
Assim surgiram dezenas de trabalhos que ele naturalmente, passados todos estes anos, até desconhecia onde se encontravam, mas a realidade era só uma, tinha feito o gosto ao dedo e sobretudo encantado o seu cliente, que orgulhosamente exibia os seus trabalhos nos sítios mais convenientes.
Assim aconteceu com Fernando Silva, que lhe solicitou alguns quadros em azulejos e os exibe com a maior estima e consideração em sítios frequentados, como é a entrada do seu museu Etnográfico, com a placa identificativa do mesmo, e o salão do restaurante Retiro Típico da Quinta do Filinto.
Os seus trabalhos são sempre admirados com minúcia fazendo mesmo inveja a sua arte, o seu saber, o seu requintado bom gosto e tantos nos têm solicitado o seu endereço, mas por vezes não é possível assim repentinamente, no entanto agora, infelizmente, as suas habilidades apenas vão ficar na memória dos seus amigos, recordá-las e apelar para que os mais novos sintam com fervor a sua arte, insistam naquele tipo de actividade, pois será uma forma de constantemente, enquanto por cá andarmos, recordarmos com muita saudade esse grande homem chamado Augusto Lenine Abreu que tão inesperadamente nos deu o desgosto de ver desaparecer para sempre.
A notícia de sua morte chegou brutalmente à nossa redacção o que nos deixou deveras tristes, por tão inesperado se ter registado.
Lenine Abreu ainda há menos de uma semana tinha falado connosco a marcar o serviço para a próxima edição do jornal “ A Voz de Torcena” onde ele era colaborador há alguns anos, rubricando a coluna “História do Dia”.
Lenine Abreu, tinha estado numa festa, mas ao sentir-se mal, teve de ser conduzido ao hospital de Cascais, onde dois dias depois infelizmente acabaria por falecer.
Lenine era das pessoas mais consideradas na freguesia de Barcarena, não só por
ter sido um excelente associativista e autarca, como
também pelo seu porte, a sua maneira de ser nunca tendo uma palavra amarga fosse para quem fosse.
Lenine Abreu foi presidente da Mesa da Assembleia de Freguesia de Barcarena, membro da Assembleia Municipal assim como pertenceu a vários executivos na autarquia de Barcarena.
Pertenceu várias vezes aos corpos gerentes dos Bombeiros de Barcarena e presentemente exercia o cargo de relator da Assembleia-Geral da Associação Cultural de Tercena, colectividade que ele estimava e inclusivamente tinha acompanhado o seu rancho folclórico numa digressão ao Brasil e estar sempre à sua inteira disposição.
Reformado da Marinha onde prestou serviço vários anos e presentemente fazia parte dos corpos gerentes de um grupo ligado a reformados marinheiros, de quem, falava das suas iniciativas com muito orgulho e entusiasmo.
O seu corpo foi velado na Igreja de S. João no Estoril e seguiu depois para o crematório de Rio de Mouro onde acabaria por ser cremado, respeitando-se a sua vontade.
A Junta de freguesia de Barcarena, por intermédio do seu presidente Vítor Alves, ainda tentou que o seu corpo fosse velado numa das capelas da Freguesia, assim como sepultado no cemitério local, mas a vontade de Lenine teria de ser satisfeita e como tal assim aconteceu no crematório de Rio de Mouro três dias depois de ter falecido.
Vítor Alves, um dos grandes e muitos amigo de Lenine Abreu, ainda adiantou sobre esta decisão de sua esposa, “se ele pudesse escolher tenho a certeza que gostaria de ser aqui velado e nesse sentido ofereci os meus préstimos”, no entanto coube à sua companheira de muitos anos, tomar muito justamente, a derradeira decisão.
Casado, com D. Lurdes Abreu, pai de dois filhos, viveu muitos anos em Tercena mas ultimamente morava no Estoril, só que era rara a semana que não visitasse Tercena e inclusivamente as instalações do jornal onde colaborava.
Tanta vez o seu nome, “Lenine”, foi alvo de momentos de paródia, pois conhecido que era o grande ditador russo que também se chamava Vladimir Lenine, os amigos parodiavam “Aí está o grande czar da Rússia”.
Ele ria, nunca levava a mal e apenas comentava. “Czar nunca, mas sim Lenine Abreu, pois sou socialista com muita convicção, mas não ditador”.
Uma gargalhada entre todos e nada mais merecia comentário, porque o que ele fomentava com muita convicção era a amizade, a concórdia e o respeito pelo seu próximo, fosse de que cor fosse, etnia, religião, ou estrato social.
O seu funeral realizou-se no passado dia de S. Martinho e foi cremado no crematório de Rio de Mouro.
O seu corpo, foi acompanhado por muita gente, apesar de estarmos num dia de semana, e com a presença de um pelotão de marinheiros que fez as honras militares com salvas.
Presentes também quase todos os membros da Junta de Freguesia de Barcarena, assim como militantes do partido Socialista, já que ele era um fiel adepto, e ainda outras instituições, pois todos lamentavam a sua tão repentina morte, quando muito ainda se esperava dele.
O corpo antes de ir para o forno crematório esteve na sala de despedida, e sem ser aberta a urna, os presentes, especialmente os seus mais directos familiares, despediram-se comovidamente, enquanto um oficial da marinha entregava à viúva D. Lurdes Abreu duas medalhas atribuídas pela armada, precisamente a “Medalha por serviços distintos com palma” e ainda a relativa à sua comissão na Guiné.
Perdeu-se um grande valor e foi pena porque Augusto Lenine Abreu ainda poderia estar muito mais tempo entre nós, mas a vida é assim mesmo, não temos poder sobre ela, resta-nos recordá-lo com saudade porque ele bem o merecia.
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