quinta-feira, 7 de abril de 2011

Recordações e Histórias de um povo

AS EIRAS E O ABASTECIMENTO DE ÁGUA A TERCENA  

  
  Nos anos trinta do século passado, Tercena, era uma terra sem condições de habitabilidade, por isso não admira que a população fosse tão escassa, pois viviam por aqui pouco mais que duzentas pessoas, só mais tarde é que o fluxo de migração despoletou com a vinda de muita gente das províncias, nomeadamente do Minho, Alentejo e Beiras com a ideia de que, à beira da capital é que se vivia bem, no entanto o local desejado para esse mesmo emprego era a lendária Fábrica da Pólvora que mantinha um ritmo galopante de serviço, devido ter despoletado nessa altura, primeiro a Guerra de Espanha e logo a seguir a II Guerra Mundial.
   Tercena, embora se distanciasse a escassos quinze quilómetros de Lisboa, tinha muitas dificuldades, pois as casas eram fracas, térreas, com um ou outro primeiro andar aqui e acolá, água canalizada não possuía e embora passasse por aqui desde os últimos anos do século XIX, o caminho de ferro, a dois passos da povoação, e a energia eléctrica fosse instalada na aldeia desde muito cedo, pouco mais existia que permitisse uma pessoa cativar-se pelo lugar.
   Assim Tercena era atravessada por uma grande rua, que sempre teve o nome pomposo de Avenida de Santo António de Tercena, que vinha quase desde a Fábrica da Pólvora até à Quinta das Lindas, numa extensão de cerca de quilómetro e meio, mas as casas só começavam a aparecer junto à mercearia do Lagarto, ou seja, mesmo no coração do lugar e depois, também terminavam um pouco mais acima da capela de Santo António, precisamente onde fazia a curva e se virava para a estrada que comunicava com Massamá, não havendo ainda a IC19, pois nesse local onde ela passa hoje, íamos encontrar a grande fonte abastecedora de água, que não era mais nem menos que uma mina arredondada que fornecia a água a parte da povoação, já que, as pessoas que viviam no lugar de baixo, acartavam-na em bilhas da fonte, existente no caminho que comunicava com o Bico,para suas casas.
     A água era a mesma que corria junto à eira, onde os agricultores mais pobres da periferia debulhavam os seus trigos, já que, em outras épocas, onde ela não era necessária, os jovens que trabalhavam na Fábrica da Pólvora treinavam ali a sua equipa de futebol, por não existir campo na localidade, dedicado àquela modalidade.
  A grande mina que ali se erguia vinha de umas fontes existentes em Massamá e continha sempre uma água muito fresca no verão e tépida no inverno, o que consistia numa enorme delícia, pois conhecemos muitas pessoas que, viviam na capital e vinham a Tercena buscar água em garrafões por dizerem que era muito boa e fresca.
    Em Tercena as pessoas para encherem as suas talhas de barro, teriam de a acartar em bilhas ou latas, desde aquele local até suas casas.
     Havia um balde, com uma corda agarrada e era assim que as pessoas puxavam o precioso líquido, atirando as sobras para o pequeno tanque que existia ao lado, onde o gado bebia, já que os pastores faziam questão de passar por ali com os animais para matarem a sede, quando regressavam aos currais vindos dos campos onde pastavam.
   Um pouco mais acima passava o caminho-de-ferro, nesse tempo comboios incómodos, fumarentos e pouco cômodos, que saíam da estação do Rossio, destinando-se a Sintra ou então para Oeste, virando o seu curso na estação do Cacém, imediatamente a seguir a Barcarena.
     Os habitantes em Tercena e Barcarena beneficiaram muito do caminho de ferro, pois as pessoas já se deslocavam à capital nele, e talvez por isso, não mostravam um tão grande atraso, como se verificava em outras localidades do interior, como Leceia, Barcarena e Valejas, pois o contacto com os lisboetas e com a sua vivência já muito influenciada pelo constante turismo, dava aos locais uma acentuada evolução, obrigando a uma grande mutação nas pessoas, modificando a sua forma de vestir, de falar e até de convivência.
   Na localidade existiam também três eiras, pois independentemente da que existia junto à mina de água a caminho da estação de caminho de ferro, havia uma outra perto do Casal do Conde de Azarujinha que era explorado por um dos Guizos, o Alfredo e mesmo ao lado era todos os anos montada a grande eira, que trabalhava para agricultores ainda mais modestos, como eram os irmãos Guizos, e outros que cultivavam poucas quantidades de trigo, mas que, igualmente necessitavam de o debulhar.
   Mais a Oeste ficava outra eira, mesmo ao lado do casal do Manuel Roque, onde vivia o dono da propriedade.
    Mais tarde, quando a eira deixou de funcionar, o proprietário deixou de viver naquele local, ficando quase ao abandono e então foi quando ali se instalaram diversas famílias, oriundas de Castro de Aire, mas depois disso, jamais ali viveu gente, porque os tempos mudaram, as facilidades de vida felizmente melhoraram bastante e o casal ficou entregue aos cuidados dos criadores de gado ovino, pois guardavam ali os seus animais durante a noite, pese embora, mesmo ao lado ficasse o casal do Crispim, outro agricultor, mas igualmente de fracos recursos, que daquela eira também se servia para debulhar as suas searas de trigo.
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