quinta-feira, 11 de julho de 2013

História do povo de Tercena

GENTE QUE JÁ DESAPARECEU DE ‘TORCENA’
      É sempre bom recordar o passado e sobretudo louvar as pessoas que tivemos o prazer de conhecer e que, pelas suas características, influência e forma estranha de vivência na vida social da terra, merecem hoje esse tributo, já que, no tempo em que viveram, nada lhes foi agradecido, e muito menos reconhecido.
   Gente pobre, de trabalho, mas ordeira e respeitadora, sacrificando-se muitas das vezes apenas para ajudar o seu conterrâneo e só isso já era um feito de tal ordem importante que merecia os nossos elogios, as nossas palavras, simples é certo, numa sincera homenagem, que bem poderá causar impacto na sociedade actual, esta, bem ao invés, interes-seira, pouco reconhecedora, desinteressada e até pouco participativa, que por muito que fizesse, jamais conseguiria su-perar os nossos antepassados.
      Num périplo cerebral, lembramos no Bico o velho Manjerico, homem dedicado ás cegadas, às danças etnográficas e à arte de bem representar e reconheça-se ter sido um grande interprete, vocação que acabaria por ser transmitida a suas filhas, que seguiram os passos de seu pai, embora não com tanto ênfase, mas de facto de forma evidente, a ponto de quando em quando serem recordadas, como tem acontecido com a Maria Cândida e a Lubélia Freire.
   Ainda no Bico, não podemos esquecer a Carlota Barreiros felizmente ainda viva, mas internada num hospício há imensos anos, mas que nos seus tempos de jovem teve papel preponderante nos teatros e danças etno-folclóricas que se realizavam na localidade.
  Seu pai o bem conhecido Pedro da Rosa, foi um exímio operário polvorista da Fábrica da Pólvora, mas depois, passado um mau momento de sua vida, dedicou-se à venda e compra de ferro velho, mas jamais desviando-se da sua conduta, tendo sido um excelente homem, pai de um grande número de filhos, e sempre de cabeça erguida para, na companhia de sua sacrificada esposa, a ti Jerónima, tudo fazer para que nada lhes faltasse, enquanto crianças e numa época em que a vida estava seriamente má no nosso país.
     No lugar de Torcena, conhecemos gente como o senhor Shazel, nome de origem alemã, mas bem português e amante da terra, que fabricava sombrinhas de senhora, assim como o senhor Américo de Carvalho, ligado à “Cartucheira” fábrica que funcionava no Bico, que acabaria por ser igualmente um grande e activo associativista, um dos fundadores do Grupo Recreativo de Tercena, conjuntamente com outros conterrâneos, como foi o merceeiro Duarte Silva, Filinto Silva, Libertário da Silva Freire entre muitos outros.
   Recordamos ainda o José da Silva, mais conhecido pelo “Contramouco”, que andou na Guerra de 1914, pai da Albertina, uma rapariga especializada em revista à portuguesa, fundamental nas danças folclóricas e uma excelente colaboradora, que acabaria por falecer ainda nova devido a problemas pulmonares.
   Mas fugindo um pouco às pessoas ligadas ao associativismo, não podemos esquecer a velha Carolina Chaves com a sua exótica forma de viver, vestindo de forma estranha e misteriosa, assim como o senhor Alarcão que morava no casal das Andorinhas, cujo filho, o menino Hugo, não se importava de trocar os seus mais ricos e caros brinquedos por aqueles que os locais, gente pobre, usavam, como as latinhas de conserva a fazer de carroças e os bois moldados nos arames ferrugentos que sobravam das debulhas, próprios para prenderem os fardos da palha de trigo que na eira do Manuel Roque eram debulhados.
    Lembramos ainda a Carolina Portas que morava num quarto alugado ao Lino da Silva, mesmo junto ao Grupo Recreativo de Torcena, uma senhora que, apesar da sua avançada idade ainda vendia roupas e dotada de um excelente bom gosto, talvez por frequentar amiudadamente a capital e ali ver montras bem recheadas de novidades e modas novas, trazendo-as para as jovens da terra comprarem e pagá-las a prestações.
     A ti Antónia e o ti Paulino familiares do velho “Calmaria” que tinha a mercearia no lugar, que mais tarde fora herdada pelo seu filho Duarte Silva, mais conhecido pelo Lagarto.
    O ti Paulino era colaborador do merceeiro e nada podia faltar à sua burra, a Balbina que, para além de acartar as bilhas da água todos os dias, desde a fonte à mercearia, lá ia todas as semanas à estação de caminho de ferro buscar as mercadorias que o Lagarto trazia da capital.
  O Ti João André, o Ti Raimundo, pai do Zé Barbeiro e do ti Arménio que viviam no caminho que dava para a fonte.
   O capitão Silveira, que sem ter grandes funções na vida social local, foi um homem que sempre defendeu os interesses da localidade onde vivia e sobretudo respeitando e colaborando, embora de forma modesta, com as iniciativas da colectividade local.
  O Raúl de Matos mais conhecido pelo Narra, homem obcecado pela sua quinta na calçada da Susana, que comunicava com o lugar do Bico, muito agarrado à sua vida e aos seus dinheiros, polémico e parecendo querer ser dono de tudo, especialmente das águas que sobravam do chafariz para regar a sus hortas, criando sempre grandes problemas com os locais.
    O velho Abílio, homem muito dedicado aos seus petiscos que fazia na barraca mesmo junto ao chafariz da terra onde passava os dias depois de reformado, conhecido pelo “Abílio das Caldeiradas”, também entregue à horticultura, sempre preocupado com as ovelhas do seu vizinho João de Peles, que, para beberem agua nos bebedouros de madeira criados de propósito para o gado saciar a sua sede, mesmo junto ao espaço que amanhava, já que por vezes iam até aos frescos legumes e era logo motivo para o Abílio desavir-se com o “Siga à Dança”, pastor do Peles, mas zangas de pouca monta, sanadas à tardinha com um “copo” na taberna do António da Rosa.
     O Manuel Maria, casado com a “ti Angélica” pai do João do Bico. Um ferroviário, que nas suas horas de folga se dedicava acerrimamente à caça nas férteis terras de Cabanas, onde ela abundava.
   A “Pipa”, lavadeira famosa que contratava raparigas da terra para as colocar, já naquele tempo, numa bem estruturada empresa de lavandaria.
  Angariava as suas freguesas na capital e punha as empregadas a lavar roupa no tanque da Quinta do “Marques Café”, no lavadouro da Fonte e até na ribeira de Barcarena, onde as suas água límpidas corriam abundantemente no lugar do Bico, desde Almornos a Caxias.
   Mesmo junto à colectividade lembramos o Alberto Silva, ligado ao Grupo Recreativo de Tercena, empregado na Companhia dos Telefones, um homem muito metódico, e conservador, pois guardava na cave de sua moradia tudo quanto encontrava na rua, fosse velho ou novo, dizendo e com alguma razão, “não serve agora mas mais tarde tem sempre aplicação”, uma verdade indesmentível que hoje as novas gerações desprezam por completo.    
    O Armando Pires, vulgarmente conhecido pelo “Farman”, guarda da Fábrica da Pólvora, que foi um grande amante do associativismo, celibatário até muito tarde, natural de Leceia mas que Tercena, onde vivia seu pai, o velho Alfredo Pires, carpinteiro e igualmente funcionário daquela unidade fabril, zelava pelos interesses da sua segunda terra.
  O Jacinto Farinha, que vindo do concelho do Entroncamento aqui se radicou, acabando por ser empregado da Fábrica da Pólvora enquanto viveu em Tercena.
    Veio para esta localidade com a sua família e propor-cionando uma nova vida à terra com a sua familiar e improvisada fabri-queta de foguetes, trabalho que aprendera com esmero na sua terra, Barquinha, à beira de seus irmãos e viera dar mais vida às localidades do concelho, com a alegria do ribombar dos seus morteiros e foguetes, anunciando as festas que por aqui se faziam.
   Lá ia ele, ou o filho montado na sua velha “pasteleira”, levar dúzias e dúzias de foguetes aos clientes dos mais distantes lugares do concelho de Oeiras, Sintra e Cascais.
     Muitas mais pessoas por aqui passaram, fizeram suas vidas, criaram história, deixaram obra, mas desapareceram, cumprindo religiosamente a lei da vida, consoladas apenas com o singelo reconhecimento das gentes de sua condição social, nem sequer bafejados com as preces divinas, por a capela de Santo António à muito ter sido profanada, mas cônscios de que, enquanto vivos, tiveram uma acção meritória, no desenvolvimento social, educacional e associativo desta terra, que  foi sempre madrasta para os seus filhos e uma extremada mãe para todos aqueles que  entenderam aqui pousar e fazer parte de suas vidas.
    “Gente, que afinal, já desapareceu de Torcena”, mas que jamais poderá ser olvidada, pois foi ela que se sacrificou, suportou os horrores de uma ditadura longa, para hoje se poder viver numa tremida paz e sossego, devido as expectativas de uma especialíssima noite de Abril, não terem resultado a contento de todos, já que mal e tardiamente tem dado alguns frutos, que parecem agora perderem-se com as exigências de uma inventada e astuta Toika, agarrada a pedra e cal a um governo que demonstra possuir mais vontade de regressar aos tempos terríveis e “salazarentos” de outrora, que dar força e ânimo à democracia que os capitães de Abril, com tanto gosto, sacrifício e vontade tentaram implantar neste privilegiado país, concebido à
 beira mar e inundado por um sol que a todos parceiros da Comunidade Europeia e não só, faz grande inveja.
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quinta-feira, 30 de maio de 2013

Os Jornais que Tercena já conheceu

30 de Abril dia da Imprensa de Oeiras
E OS JORNAIS QUE TERCENA JÁ CONHECEU
         É bem provável que muito antes tivesse existido algum outro Jornal, mas a grande verdade é que o primeiro título apareceu no final do século XIX, pelo menos que se tivesse encontrado registos, embora saibamos que estávamos numa época em que a literatura aparecia em grande plano e obviamente os jornais proliferavam.
   Estávamos no ano de 1893 quando apareceu o primeiro exemplar do jornal “A GAZETA DE OEIRAS”, tido como o primeiro a ser publicado na área do município oeirense.
      Recordando ainda esse memorável dia para a imprensa que serve o concelho, veio à memória os muitos títulos de jornais que Tercena já conheceu e todos tendo como fundador e director Fernando Silva que desde muito novo se iniciou nessa vertente cultural, como um verdadeiro amante do jornalismo.
   Fernando Silva foi pioneiro nesta actividade criando em 1975 o seu primeiro Jornal “Pico do Arieiro Informativo”, para dar a conhecer os assuntos da Madeira no seu mega restaurante, com aquele nome.
  A casa possuía muitos clientes e o ambiente que se respirava dentro dela, impunha-se levar ao conhecimento alguns locais turísticos da ilha, os quais Fernando Silva se propôs dá-los a conhecer aos seus clientes através de um curioso sorteio e foram muitas as pessoas que ali se deslocaram, numa oferta da casa, assim como todo o seu pessoal e colaboradores ali se deslocou onde esteve dez dias com todas as despesas pagas pela gerência do restaurante, que nesse altura era sobejamente conhecido por Actividades Hoteleiras Pico do Arieiro, Lda., cujos sócios eram Fernando Silva e Emília Silva.
     Em 1985, por interesses comerciais o Jornal passou a chamar-se “A Voz de Torcena”, já que, quase esgotados os temas turísticos da ilha impunha-se entrar em outras áreas, nomeadamente de Tercena e sua freguesia, e para receber  incentivos da sua autarquia municipal o jornal passou a ter aquela nomenclatura, mudança que se registou precisamente em 11 de Abril de 1985.
   Ao longo dos cerca de 38 anos de existência que já possui foram aparecendo suplementos que eram incluídos no “Voz de Torcena”, como o desportivo “Fora de Jogo”, dedicado ao desporto do concelho de Oeiras e vizinhos, Amadora, Cascais e Sintra, assim como o “Mensageiro”, que se propunha editar assuntos de índole cultural e artística.
     O “Cacém Notíciário”, foi um jornal que durou alguns meses, pois o fluxo noticioso que chegava até à redacção daquela localidade era tão grande que se impunha a criação de um órgão social dedicado àquela cidade e demais, sabendo-se não existir nenhum jornal local.
   Foi “sol de pouca dura”, pois a publicidade começou a faltar, mas mesmo assim, ainda foram publicados vários números.
     O “Tercenense” foi um outro jornal que apareceu devido ao excesso de notícias que se perdiam, no “Voz de Torcena” e praticamente as edições que foram feitas foram distribuídas único e simplesmente pela localidade, e inerentes à terra, mas depois começou a fracassar e teve de acabar.
   Outro grande jornal que Fernando Silva criou teve o nome de “Voz do Folclore” que seria o primeiro periódico regular português que publicava notícias relativas ao folclore e etnografia a nível nacional, tendo durado seis anos e chegando mesmo a ter uma grande importância em Portugal continental e ilhas, pois era procurado por todos os agrupamentos folclóricos existentes no país.
    Ao cabo teve de ser encerrado, pois as pessoas gostavam muito do jornal, mas a verdade é que, dos quatro mil agrupamentos existentes no país, conseguiu cativar cerca de mil, mas após ser estabelecida a assinatura com os agrupamentos folclóricos, no ano seguinte, devido à mudança das gerências dos mesmos, estas deixavam de ser pagas e como as verbas começaram a baixar, o jornal obviamente teve de encerrar as suas publicações, o que causou alguma tristeza a muitas centenas de pessoas que o liam mensalmente, pois foi sempre um jornal que desnudou os problemas e iniciativas dos ranchos espalhados pelo país, e que agora deixava de existir, vindo a acabar por falta de meios financeiros.
    Em Janeiro de 2012, Fernando Silva atreveu-se a novos empreendimentos e agarrando mínimos conhecimentos para lidar com as novas tecnologias em que se baseiam os actuais jornais, criou um Jornal diário através da “Internet”, que chega ao cliente por correio electrónico.
  Ideia que foi crescendo com um significativo aumento de aderentes e o jornal tem agradado pois é o primeiro e único no concelho de Oeiras, a levar a notícia a casa das pessoas, pois ela só não será lida se não houver interesse do assinante.
   De momento já possui cerca de mil endereços e calcula-se que deverá ser lido por milhares de pessoas, uma vez que está conotado com as redes sociais e por essa via chegar a locais que nem sequer a redacção imagina, tão expansiva é a rede tecnológica agora existente neste planeta, que até nos causa enorme admiração, como gente do Canadá, da China, Japão, Estados Unidos e outras nações, fazem perguntas inerentes ao que se publica nesse jornal diário.
   Numa passagem pela imprensa regional local de Oeiras, Fernando Silva, que foi director de todos os periódicos que editou, mostra agora o seu modesto mas dedicado trabalho ao serviço da comunicação social numa exposição que bem demonstra o seu grande apego à arte do jornalismo, pois para além deste longo trabalho, ainda colaborou durante 26 anos no “Diário de Notícias” do Funchal, como jornalista desportivo, assim como no “Ofsite”, que tinha as sua sede no Dafundo, mas pouco tempo durou sob a direcção do jornalista Rui Tovar e no “Jogo”, delegação de Lisboa, cujo director e responsável foi Rodrigo Pinto, um homem infelizmente já desaparecido, tratando-se de um excelente profissional, como se encontram poucos neste país para dirigir um períódico.
   Ainda colaborou com inúmeros títulos espalhados pelo país, como “O Século”, de Artur Albarran, “O Diário de Lisboa”, legado pelo seu pai que foi correspondente durante muitos anos em Barcarena, “Diário Ilustrado”, do saudoso Tabucho Alexandre, o jornal que saía para as bancas à 14 horas e era muito desejado por se tratar do primeiro vespertino diário, já que todos os outros saíam ao fim da tarde.
       O “União” de Angra do Heroísmo” da ilha Terceira dos Açores, recebeu muitos artigos assinados por Fernando Silva, assim como o “Jornal do Algarve”, “Desporto Jovem” e tantos outros títulos.
   Fernando Silva passou ainda pelo jornal “Europeu” em 1988/89, na secção de Desporto que era dirigida por José Manuel Freitas, ambos vindos do jornal ”O Jogo”, tendo ainda a colaboração de Vasco Trigo e outros jornalistas de nomeada que se mudaram para este jornal por se apresentar um projecto interessante.
   A administração era chefiada pelo General Ramalho Eanes, mas afinal o periódico acabou por fechar um tempo depois e para mal dos seus jornalistas muitos acabaram por não receber o último mês que ali trabalharam, caso de Fernando Silva e outros jornalistas
       Fernando Silva lembrou-se de criar esta singela exposição para que as camadas jovens se habilitem a projectos deste tipo, pois a continuidade destas iniciativas será da maior utilidade e porque não, tornarem-se mesmo num verdadeiro “ganha pão”, hoje tão difícil no nosso país.
    Assim, o dia 30 de Abril, que marca o início da Imprensa regional do Concelho de Oeiras, deixou de ser festejado, mas não era isso que a maioria dos jornais que o serviam pretendia.
      Não acreditamos que houvesse alguém que se negasse à continuidade dessa festa, naturalmente faltou o respectivo diálogo para recuperar essa importante convívio entre jornalistas, mas de modo mais simples, a exemplo do que tinha sido a primeira.
     Isso era o bastante para os jornalistas locais se encontrarem, conviverem e francamente ficarem mais de olhos nos olhos uns dos outros e não de costas voltadas como praticamente acontece agora.
     Por isso o 30 de Abril de 1997, deixa-nos saudades, pois nesse dia, realmente conviveu-se, conversou-se, foi desnudado o verdadeiro conteúdo desses mesmos jornais presentes, colheram dividendos com visitas de interesse e a despesa organizativa, francamente foi reduzida, pois era isso precisamente que urgia ser reposto, para satisfação dos directores, jornalistas e colaboradores dos títulos que ainda vão sobrevivendo no concelho de Oeiras, mas com muitas, mas mesmo muitas dificuldades e convívio como aquele, ajudou muito, na época, a sair da crise, senão quase todos os jornais que se publicavam nesse tempo.
   Passados todos estes anos a grande festa a maioria dos jornais que nessa época se publicavam deixou de se fazer, as dificuldades aumentaram, com muitos, inclusivamente, a terem de fechar as suas portas, outros a reduzirem o número de edições e ainda aqueles que esperam dia menos dia verem o seu trabalho de anos, ter de encerrar como acabou por acontecer com o “Jornal de Oeiras” e jornal “A Região”
     Mas neste contexto e reportando-nos ainda àquele tempo, à grande festa de 30 de Abril onde foi lembrado o primeiro jornal que se publicou em Oeiras “A Gazeta de Oeiras” resta o livro publicado onde fomos encontrar o primeiro jornal editado em Barcarena que dava pelo nome de “O Povo de Oeiras”, mas foi “sol de pouca dura”, porque para além das dificuldades serem muitas, as contrariedades eram ainda maiores, e os conteúdos por vezes bem picantes, motivavam grandes polémicas e desagrados.
   Lembramos que “O Povo de Oeiras“ se iniciou a 4 de Agosto de 1912, era um jornal quinzenal e tinha como director e editor, Virgílio Pinhão, que era naquele tempo o representante da Associação do Registo Civil em Barcarena e o secretário da redacção, João Pinheiro, órgão pertencente ao Grupo Democrático “O Futuro”, futuro que afinal foi curto, pois pouco tempo duraria.
  Tinha correspondentes em Tercena, Queluz de Baixo, Valejas e em muitas outras localidades do concelho de Oeiras, assim como era vendido em Tercena na Mercearia de Henrique da Silva, vulgarmente conhecido pelo “Lagarto”, pai do conhecidíssimo comerciante tercenense Duarte Silva.
  Apareceu mais tarde o “Divulga” em Abril de 1980, com periodicidade mensal da responsabilidade da Junta de Freguesia de Barcarena.
  Assim de momento, a imprensa que serve o concelho de Oeiras é diminuta, pois resume-se praticamente a dois jornais, “Voz de Torcena” e “Correio da Linha” já que o “Jornal da Região” está suspenso por falta de verbas para se publicar, aguardando melhores dias, pois os demais títulos acabaram por ficar pelo caminho e com a crise que agora se estabeleceu é bem possível que dentro de um ano, não haja memo nenhum a publicar-se, que seja radicado no Concelho de Oeiras.
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segunda-feira, 25 de março de 2013

As igrejas da Freguesia de Barcarena

S. SEBASTIÃO TEM IGREJA EM BARCARENA E É O ÚNICO NA FREGUESIA DE BARCARENA QUE NÃO É FESTEJADO NO SEU DIA
       Decorreu a 20 de Janeiro o dia consagrado a S. Sebastião, que terá nascido em França no ano de 256 (D.C).
 O famoso santo, é o patrono de uma igreja existente em Barcarena e segundo relatos de pessoas idosas foi festejado no princípio do século passado, havendo sempre uma festa no pequeno largo fronteiriço à capela circular, ainda existente nos nossos dias e as pessoas organizavam uma quermesse, assim como uma procissão que percorria as ruas até chegar à igreja Matriz dedicada a S. Pedro, só que devido à incerteza do tempo em Janeiro, a festa passou a organizar-se no Verão.
   Já por vezes temos indicado para que este dia seja festejado, uma vez que se trata de mais uma igreja com um santo que afinal teve uma história triste, mas importante, cheia de atribulações, a exemplo do que se passa com todos os outros existentes na freguesia de Barcarena.
   Este ano já não será possível, mas no próximo ano se a comunidade se organizar atempadamente, S. Sebastião poderá merecer também o carinho e a dedicação dos barcarenenses
  A igreja ficou abandonada, por falta de interesse das pessoas e acabaria por se tornar habitação de uma família barcarenense, precisamente os pais de João Rodrigues, que tinham sido vítimas dos estragos de uma cheia nos anos cinquenta e foi ali que passaram a viver como recurso, só que ali estiveram até que a mesma foi para obras, restaurada pela Câmara Municipal de Oeiras a 20 de Janeiro de 2000, pelo alto interesse de Isaltino Morais que era presidente da autarquia, e então passou a dedicar-se ao culto, contudo, hoje funciona como casa mortuária, mas em excelente estado de conservação.
    Era triste passar por Barcarena e ver aquele templo em tão adiantado estado de degradação, pese embora se soubesse que no seu interior vivia uma família.
   No entanto quando essa família se retirou de dentro da igreja, a sua degradação avançou mais e esteve mesmo em perigo a sua estrutura, no entanto o interior manteve-se sempre em bom estado, permitindo posteriormente as respectivas obras que vieram dar muita alegria aos barcarenenses muito especialmente a comunidade religiosa.
 Anteriormente foi pensado depositar em exposição naquela igreja o espólio do escultor Álvaro de Bré, deixado a seus filhos e que se encontra na sua propriedade em Barcarena, fechado, injustamente inibindo o público de ter acesso a tão importantes obras que dignificam a nossa cultura, por determinação de um dos seus filhos.
     Essa proibição, terá causado uma certa polémica e a ideia que fora apresentada pelo executivo da autarquia, foi posta de lado, o que foi pena, já que o artista teve a sua fama enquanto vivo, mas o projecto acabaria por cair no esquecimento, pese embora o escultor já falecido, tenha ainda hoje muitas obras suas espalhadas pelo mundo, nomeadamente na Califórnia, assim como no nosso país, com destaque para as cidades de Beja, Caldas da Rainha entre outras.
   A igreja de S. Sebastião em Barcarena, estilo árabe terá sido edificada por uma família fidalga, bastante rica que ali morava no século XV, e devota ao santo.
 No século XVIII aquando do Terramoto de 1755, a igreja resistiu, e acabaria por passar a ser o local de culto em Barcarena, devido a Igreja Matriz apresentar-se bastante danificada.
 No chão existe uma laje com a data de 1599 e escrito “Sa. Ana Prevê e seus herdeiros/nela está também enterrada Ilena Prevê sua irmã falecida na era de 1599”, contudo o edifício foi remodelado e acrescentado no século XVIII, mas essas inscrições nunca foram retiradas do interior do templo.
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sábado, 26 de janeiro de 2013

À descoberta do Historial de Barcarena

SERÁ QUE VAMOS VOLTAR À LUTA E DITADURA
 DOS ANOS TRINTA DO SÉCULO PASSADO ?
   Barcarena sempre foi reconhecida como uma terra vanguardista, referência que já vem das primeiras décadas do século passado.
  A existência da Fábrica da Pólvora e os baixos ordenados que os seus operários auferiam, contribuíram bastante para que alguns funcionários se movimentassem em Barcarena no sentido de quererem dar melhor nível de vida à sua população.
   Também por outro lado existia um razoável número de pessoas que trabalhava na Casa da Moeda em Lisboa e noutros locais que igualmente conspiravam contra o Estado Novo, onde Salazar, depois de ter assumido a presidência do conselho passou a dispor de uma grande autoridade sobre o controlo do Estado o que desagradou bastante o povo português.
   Por um lado, quando Salazar assumiu a pasta de Ministro das Finanças em 1928, substituindo o barcarenense Sinel de Cordes, as pessoas pareciam gostar dele, na medida em que o país vinha a ser governado aos atropelos, com muita escaramuças, numa verdadeira anarquia, muito especialmente depois da I Guerra Mundial, onde os governos tombavam sucessivamente.
   Mas Barcarena apesar de ter todo esse movimento revolucionário tinha como filho da terra esse político, homem que acabaria mais tarde por ser também ministro de António Oliveira Salazar, igualmente mal sucedido, por quem quase todos que lutavam contra a ditadura do seu chefe, e líder detestavam no entanto, apesar dessa sua adversa posição, Sinel de Cordes terá retirado da prisão do Aljube dois comunistas barcarenenses, mas mesmo assim a aversão que havia jamais fora retirada, e mesmo depois de ser excluído do governo, por insistentes maus resultados na pasta das finanças, o povo barcarenense o considerou a ponto de ter sido retirado o nome que tinha na rua principal de Barcarena e trocado pelo esquerdista Felner Duarte, que, acabaria por gerar grande polémica na altura
     João Sinel de Cordes que viveu na Quinta do Jardim no Murganhal, era filho de Baltazar António Sinel de Cordes e de Maria Clementina Braamcamp Ludovice da Gama, foi Ministro das Finanças por três vezes após o movimento do 28 de Maio de 1926 durante a Ditadura Militar e durante a Ditadura Nacional, tendo negociado com a Sociedade das Nações, um empréstimo a Portugal, no valor de 12 milhões de libras esterlinas, para evitar a bancarrota, mas acabaria por deixar as Finanças Públicas da Ditadura Militar num estado deplorável, situação com que teve de se defrontar com o ministro que lhe sucedeu em 1928, precisamente, Salazar.
   Nessa altura o Estado Novo foi também rotulado de salazarismo, em referência a António de Oliveira Salazar, o seu fundador e líder tornando-se, nessa pasta, figura preponderante no governo da Ditadura Militar já em 1930, valeu-lhe o epíteto de "Ditador das Finanças", ascendendo a Presidente do Conselho de Ministros, ou seja primeiro-ministro, em Julho de 1932, posto que manteve até ao seu afastamento por doença em 1968.
   A designação “salazarismo” reflectia a circunstância do Estado Novo se ter centrado na figura do "Chefe" Salazar e ter sido muito marcado pelo seu estilo pessoal de governação.
   Quando Salazar tomou conta do Governo as pessoas pareciam gostar dele, na medida em que o país vinha a ser governado aos atropelos, com muita escaramuças, numa verdadeira anarquia, muito especialmente depois da I Guerra Mundial, onde os governos tombavam sucessivamente.
    Foi uma individualidade que brilhara nos seus estudos académicos e por isso tomado como uma figura importante em Coimbra onde estudara e se formara e como tal aconselhado para formar um Governo, no entanto na sua primeira chamada, ele propôs o que pretendia fazer e logo recebeu o não, pois fartos de ditadura estavam os portugueses, aquando prevalecia a monarquia no país.
   Salazar voltou à sua vida de docente, e pouco se importou em não formar governo, contudo o descalabro político continuava de tal ordem que outro remédio não houve senão chamar então definitivamente António de Oliveira Salazar e aceitar as suas condições.
   Nos primeiros tempos o povo sentiu-se feliz com o seu trabalho, pois as finanças melhoraram a vida dos portugueses terá sofrido boas e significativas alterações, mas a partir da década de trinta, o grande economista, apertou as suas doutrinas e tudo passou a ser mais complicado para a classe trabalhadora, pois começava a desenvolver-se uma política tendencial para as classes mais abastadas, ideia talvez errada do presidente, pois pensou ser por essa via, que o país mais progredia por ser esse abastado estrato social que mais poderia investir no nosso pais, e sem investimento nada poderia singrar, o que hoje paradoxalmente, os governos parecem não entender assim.
   O povo sentiu-se acorrentado, sem recursos e sem hipóteses de dar largas às suas apetências, e a notar que de facto em Portugal começava a haver dois grupos sociais, os ricos e os pobres, ideia que contrariava bastante as leis democráticas, o que Salazar desprezara sempre, pois era ele que mandava e nada mais crepitava na sua cabeça de ditador profundo.
  Foi então que em Barcarena, aliás como em outros locais do país, as pessoas começaram a insurgir-se contra estas contrariedades, que fugiam bastante daquilo que o povo vinha a ser acostumado e logo de início os prevaricadores começaram a receber grandes castigos, pois quem conspirasse contra o Estado Novo, era preso, torturado nas prisões, sendo famoso o presídio do Aljube, e depois o Tarrafal em Cabo Verde para os mais renitentes e agressivos, assim como Caxias recebia igualmente os que andavam fora das leis salazaristas.
    Em Barcarena os revoltados conspiravam constantemente contra as leis repressivas de Salazar que inibiam o seu povo, principalmente os estratos sociais mais baixos da população a viverem condicionados ao produto miserável do seu trabalho, os filhos a não poderem estudar porque era incomportável, pois só quem tinha esse direito eram os ricos, e então nada mais lhes restava que não fosse seguir a vida de seus progenitores, agarrados aos poucos serviços que apareciam nomeadamente na fábrica da pólvora ou no campo, dependendo fortemente dos seus biscates particulares e manutenção séria das hortas e capoeiras de animais que criavam com restos de comida, que eram a base de sua alimentação.
   O barcarenense Felner Duarte alistou-se às comunas que actuavam clandestinamente na capital e arredores pois preparavam constantemente intentonas para destronar o governo salazaristas, mas a actuação, nada de concreto alcançava, resultando quase sempre numa série de prisões porque a polícia astuta de Salazar actuava com eficácia e celeridade, não perdoava, aplicando castigos terríveis e por vezes sem grandes razões, pois prendia ao mais pequeno indício de prevaricação.
     Numa dessas muitas tentativas, três empregados da Fábrica da Pólvora, Felner Duarte, Júlio do Rego e Joaquim Silva entenderam colaborar e extorquiram da fábrica da pólvora de Barcarena uma grande quantidade de nitrato de potássio para com ele os entendidos na capital fabricarem bombas artesanais, colocando esse explosivo dentro das maçanetas que roubavam das portas de casa, que eram lançadas aqui e além, só que, acabaram por ser descobertos e se o principal titular foi desterrado para Timor onde viria a morrer atacado pelos japoneses que entretanto tinham atacado a ilha, o Júlio, desviara-se inteligentemente para África e o Joaquim da Silva conseguira escapar ao terror do presídio, devido à sagacidade de sua esposa que o escondeu dentro de um forno de cozer pão, fugindo assim aos sagazes homens da Pide.
   Mas Barcarena continuava a dar nas vistas, porque depois deste episódio que deixou o povo ainda mais revoltado, surgiram outros residentes a querer dar à sede de freguesia do concelho de Oeiras, dotações que muitas outras com maior dimensão não possuíam ainda.
   Foi criada uma farmácia, um jornal, um montepio que apoiava os trabalhadores de forma já muito compensadora, um grémio agrícola, uma cooperativa de consumo, já que antes a localidade tinha fundado uma associação de bombeiros, um posto médico, uma casa do “bailho”, onde o povo se divertia e todas estas estruturas sociais foram dando nas vistas a ponto de Salazar ordenar a seus homens para vigiarem e descortinarem porque razões tudo isto aparecia numa freguesia tão pequena que pouco mais de quinhentas pessoas teria nessa época.
    O resultado foi devastador, pois os cabecilhas de todas estas obras vanguardistas, acabaram por ser presos, uns porque eram empregados do Estado, caso de alguns funcionários da Casa da Moeda, outros da Fábrica da Pólvora e não tinham o direito de trabalhar para estas causas humanistas e como a revolta tinha sido grande contra o fascismo, atirou-os para as prisões cumprindo severos castigos, perdendo os seus bons empregos conseguidos anos antes de Salazar iniciar a governação e obviamente, que todas estas estruturas acabaram por se perder precocemente por falta dos verdadeiros cabecilhas e cartolas, à excepção dos bombeiros, da cooperativa de consumo e pouco mais.
  Foram todas estas estruturas que levaram a polícia do Estado a ter, a partir dessa época, uma maior atenção sobre aquela localidade, o que revoltava cada vez mais os que actuavam clandestinamente e de quando em quando lá ia mais uma série de homens presos por serem coniventes com alguns que já estavam encarcerados, muitos deles sem a mínima razão, o que obrigava a pesados castigos e a perderem os seus valores, deixando muitas casas à mingua, por lhes faltar o chefe de família, como acontecera com Serafim Nogueira, Heliodoro Pereira, mais tarde Pedro Barreiros e seu filho Serafim e tantos, só que essa preferência, essa luta clandestina, jamais deixaria de funcionar na freguesia de Barcarena, daí que os tempos mais recentes a localidade ainda tivesse sido governada por homens de esquerda, agora transformados em comunistas, principalmente depois da revolução de “25 de Abril”, mas como se verificaram melhorias, toda essa onda esquerdista se perdeu um pouco, entrando numa normalidade e num grande sossego político.
     Só agora, depois de ter entrado Passos Coelho para o governo, a revolta passar a invadir o cérebro dos portugueses, mas as tradições brandas do povo estão a obrigá-lo cobardemente a aceitar todas as suas nefastas decisões propostas por uma injusta Troika, deixando o povo à mingua.
    Na realidade a continuar assim, bem poderá haver um regresso a todas estas características que marcaram o povo português nas primeiros décadas do século passado, incluindo os barcarenenses, precisamente à quase cem anos, mas na verdade os tempos são outros, as mentalidades diferentes e fundamentalmente o emprego já é diverso, embora difícil de se conseguir, só que já não existe uma fábrica da pólvora em plena laboração, e o povo também adquiriu um estatuto bem mais apaziguador, que lhe permite tudo aceitar, discutir mas calar-se cobardemente, subjugando-se às ordens de um novo ditador que dá pelo nome de Pedro Passos Coelho e que para revolta maior dos habitantes desta freguesia, viver precisamente a pouco mais de um quilómetro da nossa gente, mais propriamente na vizinha povoação de Massamá.
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quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

                                   BAIRRO DA ESTAÇÃO TRANSFORMOU-SE COM A NOVA ESTAÇÃO DE CAMINHO DE FERRO
    O Bairro da Estação de Caminho de Ferro de Tercena - Barcarena, está a transformar-se aos poucos e poucos, descaracterizando por completo a antiga localidade do concelho de Oeiras.
    Naquele bairro que se formou bastante cedo devido o comboio ali passar no final do século XIX, a estação de Barcarena foi construída precisamente para no dia da sua inauguração, em 2 de Abril de 1887, prestar serviço público à escassa população de Tercena e Massamá, já que o primeiro combóio que chegou a Sintra foi em 1873 com o “Larmanjat”, um monocarril que com muitas dificuldades terá demorado no percurso desde Lisboa, uma Hora e cinquenta e cinco minutos.
     Aquele troço fazia parte da linha do Oeste, integrado na extensão concebida, do Cacém a Sintra, já que a escritura de trespasse da linha férrea de Lisboa a Sintra e Torres Vedras, com mudança no Cacém, tinha sido estabelecido dois anos antes, precisamente em 18 de Outubro de 1885.
     Em 1934 receberia um galardão honroso, pois ficou classificada no 5º lugar numa iniciativa de ajardinamento da linha de Sintra.
      A estação foi embelezada na década de trinta do século passado com a sua rua de acesso ladeada de plátanos, plantados naquela época por Clemente Antunes, então cantoneiro da Câmara Municipal de Oeiras, hoje desaparecidos para darem lugar à ampliação do largo fronteiriço à nova e moderníssima estação de caminho de ferro que se concluiu agora.
     O embarque de passageiros da nova Estação que já funciona no edifício moderno, trouxe uma enorme comodidade aos passageiros de ambas as localidades, assim como maior segurança no embarque e desembarque.
      Para tristeza de todos os tercenenses, o velho edifício da estação, construído na penúltima década do século XIX, foi demolido, o que muita saudade deixou, pelo menos aos que ainda sobrevivem e se recordam do seu escasso movimento nos anos trinta e quarenta, só que o modernismo não se compadece destes saudosismos.
   A tranquilidade que se vivia na gare de embarque, onde por norma pouco mais de uma dezena de pessoas embarcava nas horas de ponta nas velhas carruagens engatadas às fumarentas locomotivas que puxavam essas primitivas carruagens, formato gaiolas, já há muitos anos deixou de existir, assim como essas ancestrais relíquias que transportavam os passageiros deixaram de funcionar, dando lugar aos modernos comboios eléctricos.
     Os campos verdejantes que se estendiam por detrás das protecções de madeira onde se recolhiam os passageiros esperando pelos comboios, a abundância de aves e outras espécies cinegéticas, que convidavam a juventude à sua caça, as saborosas amoras que forneciam as muitas amoreiras que se estendiam ao longo da empedrada gare, eram grandes atractivos para os pouco exigentes passageiros daquela época, que enquanto não chegava o transporte cortavam as folhas para alimentar os bichos de seda que seus filhos guardavam religiosamente em caixas de sapatos.
     A Fábrica da Pólvora era um dos grandes clientes do caminho de ferro nessa época, com o embarque das suas pólvoras para os mais diversos pontos do país, juntando semanalmente três e quatro vagões pela calada da noite, incomodando, é verdade, os moradores do local, mas o tempo dera-lhes paciência e habituação para aqueles nocturnos movimentos extraordinários de comboios de mercadorias, mas que faziam com que a estação fosse, apesar do seu fraco movimento, rentável.
     Com o decorrer dos tempos, a estação foi recebendo cada vez mais pessoas interessadas naquele transporte, pois Massamá cresceu com grande rapidez, Tercena nem tanto, mas a verdade é que se chegou a um ponto que era de facto urgente pensar-se a sério no embarque de passageiros que, diariamente, no final do século XX, se elevava a muitos milhares de utentes e dependentes do caminho de ferro.
   Finalmente a nova estação está construída e com os mais modernos requisitos, nada lhe faltando, amplos espaços para o estacionamento de viaturas, escadas rolantes, elevadores para servirem as quatro linhas, duas das quais e parte do edifício que irá servir a população de Tercena.
    As entradas da estação ficaram imponentes, preparadas para receber o trânsito rodoviário, comércio, vários serviços, obra que, quer os tercenenses, quer os habitantes de Massamá, muito se irão orgulhar, porque na realidade vietam valorizar e beneficiar, de maneira extraordinária as duas populações.
   Do lado de Tercena a nova rotunda irá permitir um acesso mais fácil à Estação, inclusivamente podendo levar ali os autocarros de transporte público o que até agora era quase impossível.
   Uma realidade que virá trazer largas melhorias ao local, mas muitas mais traria, no caso de Tercena, se a velha e quase deserta Avenida Aurora fosse prolongada e ligada à rede de ruas paralelas ao “IC19”, pois então o trânsito já poderia circular melhor e isso seria ainda muito mais benéfico para toda a gente.
    De qualquer forma a Av. Comendador Álvaro Vilela, deixou de ter os plátanos e com eles desaparecidos, quase foge da nossa memória as antigas histórias que ligavam o povo tercenense ao grande benemérito que tanta força e empenho mostrara no engrandecimento daquele núcleo habitacional, e afinal de Tercena.
    Foi pela sua mão que surgiram as primeiras escolas oficiais da localidade, o Grémio Escolar de Torcena e em 1946 o Posto Escolar de Tercena no edifício sede do Grupo Recreativo de Tercena, ambos sob a tutela daquele grande homem que ali tinha criado o seu quartel general na “Quinta de Santo António”, já que era administrador do Banco Espírito Santo, albergando durante anos as crianças da terra no ensino das primeiras letras.
    Ficam as recordações, as fotos antigas, os escritos e o grande cenário que se impõe altaneiro no Museu Etnográfico de Tercena para recordar esses saudosos tempos em que toda a gente se conhecia e que era diminuta a utilização dos fumarentos e pouco cómodos comboios da linha de Sintra.
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terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Antigamente as pessoas eram mais humanas

O CASAL “MIRA”
E O APOIO SOCIAL E HUMANO QUE DAVA AOS MAIS NECESSITADOS
   Tercena conheceu nos anos quarenta e cinquenta, uma família que ficou marcada na história desta terra como uma das mais sociais e humanas que por Tercena passou.
  Porfírio Simões e Maria Francisca, eram naturais da região de Sines e vieram para Tercena muito novos, precisamente nos primeiros anos da década de quarenta.
    Ela tinha servido durante muito tempo em casas de Lisboa, naquele tempo, mulheres que trabalhavam como criadas, viviam debaixo do mesmo tecto que os seus patrões, indo à sua terra Natal de tempos a tempos, pois eram como que escravas das famílias mais abastadas, contudo como a vida estava má e nas suas terras de origem ganhavam muito pouco, estas raparigas sem estudos, muitas até sem saberem ler, obrigavam-se a servir e passar por estas aventuras.
   Conhecemos muitas que até eram abusadas pelos seus patrões, e pobres, de condição baixa, sujeitavam-se a isso, apenas para poderem usufruir de um pouco de carinho, uma melhor alimentação, já que a fraca jorna que lhes era atribuída ao final do mês, e muitas até só no final do ano, era uma mais valia importantíssima para delinearem o seu futuro.
   A Maria Francisca, vulgarmente conhecida pela “Mira” trabalhou em Lisboa em diversas casas, e por este processo, logo que viu chegar a oportunidade de se soltar desta vida, acompanhou o seu marido, o Porfírio Simões, também alcunhado pelo “Mira” numa migração vulgar, em busca de melhores dias junto da capital portuguesa, acabando por se radicarem em Tercena.
  Ela era muito espirituosa e mais tarde, quando lhe ofereciam sopa para comer respondia altiva e com um sorriso muito especial no rosto.
    “Sopa, farta de ser sopeira fiquei eu quando trabalhava em casa das minhas patroas”.
  Ele, atraído pelo trabalho quase garantido da Fábrica da Pólvora e ela, deixando as suas antigas patroas, partiram para uma nova aventura, deixando os seus familiares e o seu torrão natal.
    A II Guerra Mundial estava instalada no seio da Europa, e a guerra civil de Espanha matava a esmo em terras de “nuestros irmanos” e estes dois terríveis acontecimentos na Europa, obrigavam que a Fábrica Militar de Barcarena, não parasse de noite e dia no fabrico de material bélico para os abastecer, porque Salazar não dormia, esperto não participou nestes conflitos, mantendo neutralidade apenas para poder facturar as muitas munições e explosivos que fabricava em Barcarena.
    Foram pais de três filhos, a Alda, a Manuela e o Álvaro e foram morar numas casas pertencentes ao Filinto Silva e por ali se deixaram ficar durante muito tempo, pois este proprietário, como era empregado superior na Fábrica da Pólvora, arranjou-lhe trabalho naquela unidade fabril.
  Ele, tal qual se previa, colocou-se radiante na fábrica como servente e ela ficou-se pelos seus trabalhos domésticos, uma vez que, com três filhos pequenos para criar, tinha muito com que se entreter.
  Tornou-se um casal muito popular por serem muito prestáveis, pois ela a todos acudia e mesmo com escassos recursos, valia a toda a gente, enquanto ele não lhe ficava nada atrás, pois sempre que alguém lhe solicitava os seus préstimos, acorria de imediato sem olhar a recompensas, embora por vezes recebesse compensações, especialmente quando era chamado para despejar fossas, enterrar animais domésticos que morriam, ou para vestir defuntos, tarefa que tanto ele, como ela se prestavam com a maior das simplicidades, recebendo depois roupas daquele que faleciam, homem ou mulher e logo no dia a seguir usavam essas mesmas vestes sem possuírem quaisquer dúvidas ou receios.
     Mas a família “Mira” ficou caracterizada pelo facto de ser muito humana, no entanto não se julgue que vivesse desafogadamente, pois bem ao invés, ele com um mísero ordenado de vinte e oito escudos por dia, mal chegava ao fim de semana para alimentar a família e por essas razões, ela, obrigava-se a lavar roupas, ou fazer quaisquer outros serviços, a quem lhe solicitasse.
     Na época do Natal apareciam sempre em Tercena, grupos familiares que deambulavam miseravelmente pelo país apresentando um simples espectáculo de circo ao ar livre e então, por norma, faziam o seu trabalho quase junto à sua porta, precisamente na entrada da Travessa 5 de Outubro que comunica com o chafariz e tanque das lavadeiras a caminho do lugar do Bico.
    Era aí que essa gente pousava, sem consentimento de ninguém, mas também, verdade se diga, que nenhum vizinho reclamava, por saberem que se tratava de gente muito pobre que daquela forma tentava ganhar a vida e era precisamente a “Mira” que ao ver, por vezes, crianças pequenas, mal vestidas, passando fome e frio com roupas de todo o ano, que as levava para sua casa, lhes dava de comer e vestindo-as com trapos velhos de seus filhos, mas muito melhores que aqueles que as crianças usavam e isso era uma acção social que, embora na época ninguém reparasse, deixava-a bastante consolada, porque custava-lhe muito ver aqueles desgraçados inocentes, que não tinham a culpa de terem nascido, passarem tão mal e por vezes tão pequenos.
   Os pais lá apresentavam à noite, quando o tempo deixava, o seu modesto espectáculo, onde não faltava a cabra e o burro escanzelados, grande transporte dos parcos apetrechos do improvisado circo, o escadote e alguns sacos com as suas roupas encardidas e acabrunhadas com que se apresentavam ao público.
    As pessoas de Tercena compareciam para ver, também diga-se em abono da verdade, que pouca animação havia na terra, pois raramente se faziam espectáculos na colectividade local e então servia para passarem um pouco de tempo e também, muitos com o sentido humano de ajudar aquela pobre família, que daquela forma corria o país de terra em terra.
  A “Mira” facilitava a sua pobre casa a esta gente, dando-lhes comer, e por vezes até dormida, quando via que era desumano deixar aquela família aconchegar-se debaixo de um pano que armavam com duas varas, atrás da casa da D. Esperança ou do tanque onde as mulheres lavavam a roupa, para passarem a noite, sabedora de que chovia fortemente.
  Era isto que mais ninguém se atrevia a fazer, sem conhecer as pessoas de lado nenhum, sujeita a criar problemas, mas esses medos eram coisas que não pairavam na mente daquele casal, considerado os pais dos desgraçados que gravitavam por esse país fora e de quando em quando apareciam em Tercena.
  Também nas noites cálidas do verão, aparecia o homem do cinema com a sua máquina muito obsoleta, funcionando a acetileno, que projectava contra a parede alva da Margarida Pires, mesmo diante do café do Parreirinha, os filmes mudos que encantavam, especialmente a rapaziada, que, quando os viam chegar, andavam de um lado para o outro a transmitir às pessoas do lugar que tinha chegado o homem do cinema.
  E a grande verdade é que o muro do “Lagarto” enchia-se de gente ávida por ver aquelas películas americanas muito antigas, como o “Charlot”, filmes de cowbois e tantas outros a preto e branco, sendo mesmo um grande entertenimento às vezes durante uma semana.
    O “Mira” recebia aqueles homens como que fosse o “alcaide” da terra, o chefe de uma clã, ou comparável, dando-lhes de comer e era ele que no final da sessão passava com uma bandeja a recolher donativos para ofertar ao projectista que agradecia imenso retirando-lhe uma grande e importante tarefa.
    O “Mira” adorava ver estes filmes, especialmente os de cowbois e quando as coisas corriam mal para o lado do herói da fita, gritava:
   “Mira manca está com a tranca”, ou então quando se tratava de cenas mais amorosas, o “Mira derretia-se todo e gritava; “agora o rapaz morreu e a rapariga casa com o cavalo”.
  Uma gargalhada fazia-se ouvir e a boa disposição reinava sempre nessas noites agradáveis, onde as pessoas acorriam por o cinema nessa época ser uma grande novidade, e Tercena raramente receber os ambulantes que, projectavam esses filmes na colectividade, já com som e com grandes artistas, só que era muito raro, aparecendo em média duas ou três vezes por ano.
   Ainda neste tipo de distracção, na localidade, nos anos quarenta e cinquenta surgiam ainda pelo menos duas vezes por ano o ventrículo que portava sempre dois bonecos, o “Sebastião” e o “Ambrósio”, que se detestavam, nas histórias que o artista contava com entusiasmo e um certo humor.
     E perguntava a ambos: “Ambrósio”, o mais mariquinhas, “o que queres ser quando fores grande ?”
    E o boneco, através da voz de falsete do artista, respondia: 
”Passarinho”.  “Para quê ?”, insistia o artista.
    “Para poder voar pelo espaço!”, respondia o boneco.
    Depois virando-se para o outro, mais malandreco e refilão, questionava-o:  “E tu Sebastião ?”  respondendo logo de seguida  “Espingarda!”.
     O artista voltava a perguntar:  “Para quê ?”
      E o Sebastião com voz grossa de rufia, ripostava. “Para matar o passarinho. Eu não o gramo!”.
  Era uma risota geral à porta da mercearia do Lagarto, no largo 1º Maio onde as pessoas, munidas de cadeiras que traziam de casa, ali se sentavam para ver este tipo de espectáculo, que tinha tanto de artístico, como de boa disposição.
   Tratava-se de pessoas mais evoluídas, privilegiadas que já não se apresentavam tão miseravelmente como as do circo ou do cinema e assim viviam correndo as localidades vizinha com estes improvisados programas que distraíam o povo, já que este, por norma não tinha acesso aos grandes espectáculos que decorriam na capital, e nos grandes centros urbanos.
    Mas a grande verdade e moral destas histórias era o espírito humano e social que reinava no seio das nossas gentes, pois acolhia estes personagens, alguns até com grandes recursos artísticos, com todo o carinho, sem desconfianças, ajudando-os na sua grande e árdua luta pela vida e por norma sempre olhando as crianças que se obrigavam a deambular junto de seus familiares, tanta vez passando fome, sem acesso à escolaridade e logo de pequeninos, obrigando-se a participarem no espectáculo fazendo números arriscados, como era o obrigatório número de contorcionismo que, sem exibirem grande qualidade, acabavam por ser aplaudidos por se perceber o grande esforço, a sua grande coragem que demonstravam e sobretudo tratarem-se de crianças de tenra idade, imbuídas já no espírito de ajudar os seus pais para que pudessem passar um pouco melhor.     
   A “Mira” era uma pessoa muito sensível e por isso ficou demarcada pelo seu grande espírito humano, altruísta e amiga de quem tinha dificuldades, esquecendo-se muita das vezes que ela pertencia a esse mesmo grupo social, já que na sua casa também tinha que acorrer a apoios extras por nutrir sérias dificuldades, pois o ordenado de seu marido não chegava para fazer face às despesas das cinco pessoas que compunham o seu agregado familiar, dando aquilo que tinha em casa aos outros por entender serem mais necessitados que ela, faltando, incrivelmente, por vezes aos seus próprios filhos.
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