terça-feira, 15 de novembro de 2011

O Pf.Manuel Vaz era um professor austero mas com grande poder de ensino


Último Episódio
ABASTADOS ?...QUEM É QUE DO BAIRRO DA ESTAÇÃO ERA ABASTADO ?...


    A D. Susana Carapeta lembra-se perfeitamente do Professor  Manuel Vaz, pois ainda tem de memória o dia em que foi numa excursão  dirigida por ele à Marinha Grande, das muitas que organizou, sempre no intuito de instruir os seus alunos e de lhes mostrar as grandes fábricas e os grandes pólos económicos do país, atenções de Mestre que hoje praticamente pouco se vê e que naquele tempo já constituía uma das suas grandes  preocupações.
   A D. Susana frequentava a escola do Grémio  da Estação, mas nunca chegou a ser aluna dele e como tal foi integrada no lote de crianças  que ali estudava naquele tempo, para visitar uma  das famosas fábricas de vidros.
     «Não foi meu professor, mas sei que tocava violino muito bem. Eu estava no Grémio, aliás a única escola que na altura havia em Torcena».
    E aproveitou para  nos dizer que as pessoas do Bairro da Estação nessa altura, não eram abastadas, mas sim viviam do produto do seu trabalho, contrariando o depoimento de algumas pessoas neste trabalho.
  «Mas afinal quem eram os abastados aqui do Bairro da Estação?... Ora vinham alunos de todos os lados aqui para a escola. De S. Marcos, Talaíde, Barcarena, Massamá, Tercena e muitas outras localidades, que frequentaram aqui o ensino primário e acabaram por fazer o seu exame da quarta classe».
   A escola era mantida por pessoas residentes no Bairro e não só, como apontou a D. Susana, pois foi graças a esses senhores que as crianças puderam ali aprender e focou alguns desses contribuintes que ajudaram a manter o ensino no Grémio Escolar e obviamente, pagar às professoras, como os senhores, Carapeta, Brás, Vilela, Virgílio Cruz, Neto pai duma professora de piano a D. Argentina Neto, Vieira e muitos outros.
 «Essas pessoas quotizavam-se por forma a que fosse possível ao fim do mês arranjar-se dinheiro para se pagar às professoras que no Grémio Escola davam aulas».
   «A D. Teresa Alão, D. Fernanda de Massamá que ministrava a primeira e segunda  classes e a D. Catarina uma senhora  mulata mas que era uma excelente professora, pois  nós apesar de sermos crianças nunca fizemos qualquer reparo ou comentário ao facto da sua cor de pele».
    A D. Susana fez questão em reafirmar  que as pessoas que viviam na Estação não eram abastadas, e citou  como exemplo o seu pai, que  era apenas oficial do Exército.
  «Eu não considero que ele fosse abastado, embora tivesse alguns valores em Runa deixados pelos seus pais. O Sr. Virgílio Cruz era funcionário da CP e  como tal nunca ouvi dizer que ele fosse abastado. O sr. Brás a mesma coisa e como tal não sei aqui quem é que tivesse sido abastado», contestou a D. Susana a propósito dessa informação veiculada em depoimentos anteriores de outras fontes neste trabalho.
   «Os alunos que aqui estudavam vinham a pé dos mais variados sítios e no Inverno quando chegavam tinham de tirar as botas à porta da escola porque  estavam atolados  em lama e que eu saiba todas essas crianças eram filhas de gente pobre».
     E lembrou-se  depois do Álvaro Vilela o único, em sua perspectiva, que poderia ser considerado abastado, mas mesmo sim garantiu-nos que não sabia como.
  Álvaro Vilela foi director do Banco Espírito Santo em Lisboa, mantinha em Tercena um palacete servido por  diversos criados, todos eles com funções específicas, cozinheira, ama de quartos, carpinteiro,  governanta, que bem conhecemos a Conceição Barbosa e muitos outros, no entanto a D. Susana não reconhece tratar-se de um homem abastado.
  «Não sei porque consideravam o Sr. Vilela como um homem abastado. Apenas por ter sido director do banco?... É preciso  que saibam que esse senhor, se obteve a posição que conseguiu, subiu a pulso, com o esforço do seu trabalho, de horas extraordinárias que fez e como tal chegou ao ponto que chegou.»
   «Todos nós daqui ficamos  muito a dever ao Sr. Vilela, pois foi ele que levou muita gente  daqui e conseguir o seu trabalho no Banco Espírito Santo», salientou aquela senhora. 
 E recordou o seu ex-marido, Coelho Marques que alcançou uma excelente posição  no Banco de Fomento e Exterior de onde está actualmente reformado por mérito próprio, mas jamais sendo um abastado.
  «Ora em face  de tudo isto não vejo quem é que por aqui  tivesse sido abastado».
 E recordou depois o seu avô que foi engenheiro e serviu a Fábrica da Pólvora durante vinte e tal anos como Mestre.
    Chamava-se Aníbal de Azevedo que acabou por merecer o nome de uma rua na cidade da Amadora pois foi através dos seus grandes esforços e dedicação que viera a recebera essa homenagem.
  «Era acérrimo republicano e deputado. Foi  administrador da Câmara Municipal de Sintra acabando mesmo por ser Ministro do Comércio, pois foi notável o seu dedicado trabalho para elevar a freguesia a actual cidade de Amadora».
   «Ao meu avô igualmente se ficou muito a dever pois levou bastantes rapazes daqui para a Casa da Moeda onde esteve durante muito tempo», afirmou convicta de que, apesar de tal não era uma pessoa abastada.
  E a propósito do Sr. Álvaro Vilela, um grande benemérito que viveu em Tercena, muita gente ainda hoje ousa tecer comentários desagradáveis contra as suas atitudes naquele tempo, esquecendo-se  esses indivíduos, que não sabem fazer outra coisa que não seja dizer mal e criticar os outros, que, por exemplo o Grupo Recreativo de Tercena, foi produto do seu esforço, dedicação e do muito dinheiro que  emprestara  aquando da  construção do edifício sede daquela colectividade.
    «Uma verdade indesmentível. É uma grande vergonha, essa falta de reconhecimento de algumas das pessoas da terra, pois ele ajudou toda a gente, inclusivamente os próprios Bombeiros Voluntários de Barcarena, a ponto de ter criado uma secção de bombeiros na sua casa, e proporcionando  muitos exercícios simulacros no seu palacete, no sentido de dotar os «soldados da paz», com maiores aptidões».
   E Tercena hoje não tem um quartel de Bombeiros porque encontrou sempre uma enorme oposição por parte das direcções dos Bombeiros de Barcarena que o levou mesmo a desistir, pois chegou a haver receios de que a criação da secção de Tercena viesse mais tarde superar a Associação de Barcarena, pois ele até deu a sugestão ao conceber-se o  imóvel do Grupo Recreativo de Tercena,  ficar equipado numa ala do edifício, instalações apropriadas  para  o funcionamento dum quartel de bombeiros.
    Essa ideia não foi avante e esse  espaço acabaria depois por ser utilizado para uma escola primária e o material existente repartido por corporações dos arredores, inclusive a que ele fundou no Orfanato Escola Santa Isabel em Albarraque.
   E para terminar esta conversa franca e espontânea, a D. Susana Carapeta confirmou que infelizmente existem sempre rivalidades nas localidades e este caso dos abastados, terá sido uma razão da pequena diferença de mentalidades existente entre as pessoas que nesse tempo viviam no Bairro da Estação e as do lugar, porque ao fim e ao cabo, era a maneira de viver delas que impressionava os vizinhos do lugar de Torcena, porque afinal, abastados, abastados só reconhecemos de facto o  Sr. Álvaro Vilela,  pois os outros viviam do produto honesto dos seus trabalhos, mas mesmo assim, a vida no lugar era tão pobre, tão resumida, as pessoas tão simples quanto ignorantes, que era precisamente isso que os obrigava por vezes a focar essa distinção.
   «Sempre existiram rivalidades, por isso é que existem guerras, e senão vejamos no nosso país que é tão pequeno a guerra que se trava diariamente entre o norte e  o sul. Instalaram-se  doentias rivalidades entre Porto e Lisboa. Nas vilas, nas diversas cidades do país contra as capitais de distrito, e inclusivamente toda a gente sabe da  bastante antiga rivalidade entre Tercena e Barcarena, duas terras que foram sempre tão pequenas e insignificantes em relação ao país, mas infelizmente com azedumes entre as pessoas e as vezes sem razões para tal. É assim, mas nem sempre podemos aceitar as ideias dos outros, porque abastados?....  Quem é que do Bairro da Estação era abastado?...»,  concluiu a D. Susana Carapeta, a propósito das suas lembranças e relacionamentos  sobre o  Professor Manuel Vaz, outra grande amante da terra onde vive há muitos anos e onde tem feito a sua vida, sempre pronta em colaborar nas iniciativas locais no sentido da preservação do bom nome das gentes que aqui sempre viveram e que lutaram, heroicamente por este pedaço de torrão do concelho de Oeiras.

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